A CNBB


               De 9 a 19 de abril, aconteceu em Aparecida a 51ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), na qual estive presente com os outros irmãos no episcopado, demonstrando a nossa comunhão eclesial efetiva e afetiva.
            A natureza das conferências episcopais foi exposta na Carta Apostólica Apostolos suos, do Beato João Paulo II, onde cita o decreto Christus Dominus do Concílio Vaticano II, que considera “muito conveniente que, em todo o mundo, os Bispos da mesma nação ou região se reúnam periodicamente em assembleia, para que, da comunicação de pareceres e experiências, e da troca de opiniões, resulte uma santa colaboração de esforços para bem comum das Igrejas”. Ensina ele que “a união colegial do Episcopado manifesta a natureza da Igreja... Assim como a Igreja é una e universal, assim também o Episcopado é uno e indiviso, sendo tão extenso como a comunidade visível da Igreja e constituindo a expressão da sua rica variedade. Princípio e fundamento visível dessa unidade é o Romano Pontífice, cabeça do corpo episcopal”.
         Mas a Conferência Episcopal, instituição eclesiástica, não existe para anular o poder dos Bispos, instituição divina. O Papa emérito Bento XVI, quando Cardeal, falou sobre um dos “efeitos paradoxais do pós-concílio”: “A decidida retomada (no Concílio) do papel do Bispo, na realidade, enfraqueceu-se um pouco, ou corre até mesmo o risco de ser sufocada pela inserção dos prelados em conferências episcopais sempre mais organizadas, com estruturas burocráticas frequentemente pesadas. No entanto, não devemos esquecer que as conferências episcopais... não fazem parte da estrutura indispensável da Igreja, assim como querida por Cristo: têm somente uma função prática, concreta”. É, aliás, continua, o que confirma o Direito Canônico, que fixa os âmbitos de autoridade das Conferências, que “não podem agir validamente em nome de todos os bispos, a menos que todos e cada um dos bispos tenham dado o seu consentimento”, e quando não se trate de “matérias sobre as quais haja disposto o direito universal ou o estabeleça um especial mandato da Sé Apostólica”. E recorda o Código e o Concílio: “o Bispo é o autêntico doutor e mestre da Fé para os fiéis confiados aos seus cuidados”. “Nenhuma Conferência Episcopal tem, enquanto tal, uma missão de ensino: seus documentos não têm valor específico, mas o valor do consenso que lhes é atribuído pelos bispos individualmente”.
            E continua o Papa emérito: “O grupo dos bispos unidos nas Conferências depende, na prática, para as decisões, de outros grupos, de comissões específicas, que elaboram roteiros preparatórios. Acontece, além disso, que a busca de um ponto comum entre as várias tendências e o esforço de mediação dão lugar, muitas vezes, a documentos nivelados por baixo, em que as posições precisas são atenuadas”. E ele recorda que, em seu país, existia uma Conferência Episcopal já nos anos 30: “Pois bem, os textos realmente vigorosos contra o nazismo foram os que vieram individualmente de prelados corajosos. Os da Conferência, no entanto, pareciam um tanto abrandados, fracos demais com relação ao que a tragédia exigia” (A Fé em crise, IV).

A RIQUEZA DOS POBRES


Em nosso último artigo falamos sobre a Igreja dos pobres. Agora falemos da sua riqueza. A riqueza dos pobres é a Igreja, sua rica doutrina e sua liturgia. As igrejas, os templos sagrados, são a casa dos pobres. Lá eles podem entrar sem serem impedidos. Lá eles podem se sentir bem, contemplar belas pinturas e arquiteturas, vasos sagrados, esplêndidas imagens, como não poderiam fazer em nenhuma outra casa ou palácio. Ali eles podem, pois é a casa deles.
            A pobreza pessoal, que devemos cultivar, não significa que devemos empobrecer a liturgia. Pelo contrário, a beleza exterior da liturgia deve refletir a glória de Deus, como nos ensina o Papa Francisco: “As vestes sagradas do Sumo Sacerdote são ricas de simbolismos; um deles é o dos nomes dos filhos de Israel gravados nas pedras de ónix que adornavam as ombreiras do efod, do qual provém a nossa casula atual...” “beleza de tudo o que é litúrgico, que não se reduz ao adorno e bom gosto dos paramentos, mas é presença da glória do nosso Deus que resplandece no seu povo vivo e consolado”. (Hom. Missa Crismal, 28/3/2013).
            O Santo Cura d’Ars, São João Maria Vianney, exemplo para todos os padres, amava a pobreza pessoal e os pobres. “Uma batina velha fica muito bem debaixo duma casula bonita”, dizia ele. Ao lado da sua pobreza individual, não media esforços em adquirir o que havia de mais rico e suntuoso para a casa de Deus e as cerimônias litúrgicas. Ele dizia que se os palácios dos reis são embelezados pela magnificência, com maior razão as Igrejas.
Quando Cardeal, o Papa Bento XVI, lamentando a atual crise litúrgica, comentava: “Depois do Concílio, muitos padres deliberadamente erigiram a dessacralização como um programa de ação, argumentando que o novo testamento aboliu o culto do templo; o véu do templo, que se rasgou de alto a baixo no momento da morte de Cristo sobre a cruz, seria, para alguns, o sinal do fim do sagrado... Animados por tais ideias, eles rejeitaram as vestes sagradas; tanto quanto puderam, eles despojaram as igrejas dos seus resplendores que lembram o sagrado; e eles reduziram a liturgia à linguagem e aos gestos da vida de todos os dias, por meio de saudações, de sinais de amizade e outros elementos” (Conferência aos Bispos chilenos, Santiago, 13/7/1988).
Falando sobre essa beleza da liturgia e respondendo às “acusações de ‘triunfalismo’, em nome das quais se jogou fora, com excessiva facilidade, muito da antiga solenidade litúrgica”, o então Cardeal Ratzinger explicava: “Não é triunfalismo, de forma alguma, a solenidade do culto com que a Igreja exprime a beleza de Deus, a alegria da fé, a vitória da verdade e da luz sobre o erro e as trevas. A riqueza litúrgica não é riqueza de uma casta sacerdotal; é riqueza de todos, também dos pobres, que, com efeito, a desejam e não se escandalizam absolutamente com ela. Toda a história da piedade popular mostra que mesmo os mais desprovidos sempre estiveram dispostos instintiva e espontaneamente a privar-se até mesmo do necessário, a fim de honrar, com a beleza, sem nenhuma avareza, ao seu Senhor e Deus” (Rapporto sulla Fede, 1985).    

A IGREJA DOS POBRES


        O nosso Papa Francisco disse que escolheu o nome do “pobrezinho de Assis”, inspirado no conselho de Dom Cláudio Hummes: “Não se esqueça dos pobres!” “Ah, como eu queria uma Igreja pobre e para os pobres!”, disse ele aos jornalistas. Aliás, foi assim que São Francisco de Assis recuperou a credibilidade da Igreja.
            Realmente, a mensagem evangélica é paradigmática: “O Reino (de Deus) pertence aos pobres e aos pequenos, isto é, aos que o acolheram com um coração humilde. Jesus é enviado para "evangelizar os pobres" (Lc 4,18). Declara-os bem-aventurados, pois "o Reino dos Céus é deles" (Mt 5,3); foi aos "pequenos" que o Pai se dignou revelar o que permanece escondido aos sábios e aos entendidos. Jesus compartilha a vida dos pobres desde a manjedoura até a cruz; conhece a fome, a sede e a indigência. Mais ainda: identifica-se com os pobres de todos os tipos e faz do amor ativo para com eles a condição para se entrar em seu Reino” (C. I. C. 544).
“Quando envergamos a nossa casula humilde pode fazer-nos bem sentir sobre os ombros e no coração o peso e o rosto do nosso povo fiel, dos nossos santos e dos nossos mártires, que são tantos neste tempo. fixemos agora o olhar na ação. O óleo precioso, que unge a cabeça de Aarão, não se limita a perfumá-lo a ele, mas espalha-se e atinge «as periferias». O Senhor dirá claramente que a sua unção é para os pobres, os presos, os doentes e quantos estão tristes e abandonados. A unção, amados irmãos, não é para nos perfumar a nós mesmos, e menos ainda para que a conservemos num frasco, pois o óleo tornar-se-ia rançoso... e o coração amargo” (Papa Francisco, Homilia da Missa Crismal, 28/3/2013).
            A Igreja, seguindo o exemplo de Jesus, faz na sua evangelização a opção preferencial pelos pobres. Opção preferencial, mas não exclusiva, pois todos são chamados à salvação. A Igreja não despreza ninguém, os pobres, por serem os mais abandonados pela sociedade, e os ricos, os empresários, os que possuem bens e influência nesse mundo são sempre acolhidos: muitas vezes eles são até mais pobres e necessitados do que os que não têm bens materiais.
Ademais, o dinheiro pode ser bem empregado, sobretudo em se tratando das coisas de Deus.
Narra o Evangelho a passagem de Jesus na casa de Lázaro, quando Maria tomou um perfume precioso e caro e com ele ungiu os pés de Jesus. Judas se indignou e, diante do que julgava um desperdício, tomou a defesa dos pobres. Jesus, porém, defendeu o gesto de Maria: “Pobres, sempre os tereis entre vós. Mas a mim nem sempre me tereis!” (Jo 12, 3-8). 
Jesus, nascendo e vivendo pobre, não discrimina ninguém: no seu presépio vemos pobres e ricos, pastores e reis. Todos são bem-vindos ao berço do “príncipe da paz”. Com seu exemplo, ele prega a humildade e não a soberba, a caridade e não a inveja, o desapego e não a ambição, a paz e não a luta de classes. A desigualdade, quando não é injusta, é natural e normal, podendo ser suavizada e superada pela prática das virtudes cristãs. Amemos e consolemos os pobres, os preferidos de Deus, sem lançarmos no coração deles a amargura da inveja e ambição. 

A DERROTA E A VITÓRIA


Estamos na semana da Páscoa, a maior festa religiosa do calendário cristão, a festa da gloriosa Ressurreição de Jesus Cristo, a sua vitória sobre o pecado, sobre a morte e sobre a aparente derrota da Cruz. Cristo ressuscitou glorioso e triunfante para nunca mais morrer, dando-nos o penhor da nossa vitória e da nossa ressurreição. Choramos a sua Paixão e nos alegramos com a vitória da sua Ressurreição. Para se chegar a ela, para vencer com ele, aprendemos que é preciso sofrer com ele: “Quem quiser vir após mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Mt 16,24). “Que por sua Paixão e morte de Cruz cheguemos à glória da Ressurreição”. 
Como figura, esta festa já existia no Antigo Testamento. Era a celebração da libertação da escravidão do Egito, na qual sofreram os israelitas, povo de Deus, por muitas gerações, sendo libertados por Moisés que, por ordem do Senhor, fulminou os egípcios com as célebres dez pragas. Na última dessas pragas, na passagem do anjo de Deus (Páscoa, em hebraico), os egípcios foram castigados com a morte dos seus primogênitos, ao passo que os hebreus foram poupados pelo sangue do cordeiro que imolaram, conforme o Senhor havia prescrito. Todos os anos, em ação de graças, eles repetiam, por ordem de Deus, essa ceia de Páscoa: milhares de cordeiros eram imolados na sexta-feira antes da Páscoa.
Esse cordeiro pascal era figura daquele Cordeiro de Deus que, numa sexta-feira antes da Páscoa foi também imolado, realizando, com o seu sangue, a libertação do mundo do pecado, ressuscitando no terceiro dia. Essa é a nossa festa da Páscoa, a festa da Ressurreição de Cristo, o verdadeiro Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo, e, ressuscitado, nos dá a vida.
“Jesus não é um morto, ressuscitou, é o Vivente! Não regressou simplesmente à vida, mas é a própria vida, porque é o Filho de Deus, que é o Vivente (cf. Nm 14, 21-28; Dt 5, 26, Js 3, 10). Jesus já não está no passado, mas vive no presente e lança-Se para o futuro; Jesus é o «hoje» eterno de Deus. Assim se apresenta a novidade de Deus diante dos olhos das mulheres, dos discípulos, de todos nós: a vitória sobre o pecado, sobre o mal, sobre a morte, sobre tudo o que oprime a vida e lhe dá um rosto menos humano. E isto é uma mensagem dirigida a mim, a ti, amada irmã, a ti amado irmão. Quantas vezes precisamos que o Amor nos diga: Por que buscais o Vivente entre os mortos? Os problemas, as preocupações de todos os dias tendem a fechar-nos em nós mesmos, na tristeza, na amargura… e aí está a morte. Não procuremos aí o Vivente! Aceita então que Jesus Ressuscitado entre na tua vida, acolhe-O como amigo, com confiança: Ele é a vida! Se até agora estiveste longe d’Ele, basta que faças um pequeno passo e Ele te acolherá de braços abertos. Se és indiferente, aceita arriscar: não ficarás desiludido. Se te parece difícil segui-Lo, não tenhas medo, entrega-te a Ele, podes estar seguro de que Ele está perto de ti, está contigo e dar-te-á a paz que procuras e a força para viver como Ele quer” (Papa Francisco, Homilia da Vigília Pascal).