FELIZ ANO NOVO DE PAZ!

            Em sua mensagem para o 50º dia mundial da Paz, que se celebra no próximo dia 1º de janeiro, sob o título “A não-violência: estilo de uma política para a paz”, o Santo Padre, o Papa Francisco, formula seus votos de paz aos povos e nações do mundo inteiro, aos chefes de Estado e de governo, aos responsáveis das Comunidades Religiosas e das várias expressões da sociedade civil, rezando para que “a imagem e semelhança de Deus em cada pessoa nos permitam reconhecer-nos mutuamente como dons sagrados com uma dignidade imensa”, insistindo que “sobretudo nas situações de conflito, respeitemos esta dignidade mais profunda e façamos da não violência ativa o nosso estilo de vida”.
Desejo deter-me na não-violência como estilo duma política de paz, e peço a Deus que nos ajude, a todos nós, a inspirar na não-violência as profundezas dos nossos sentimentos e valores pessoais. Sejam a caridade e a não-violência a guiar o modo como nos tratamos uns aos outros nas relações interpessoais, sociais e internacionais. Quando sabem resistir à tentação da vingança, as vítimas da violência podem ser os protagonistas mais credíveis de processos não-violentos de construção da paz. Desde o nível local e diário até ao nível da ordem mundial, possa a não-violência tornar-se o estilo caraterístico das nossas decisões, dos nossos relacionamentos, das nossas ações, da política em todas as suas formas”.
A guerra e a vingança não são a solução: “A violência não é o remédio para o nosso mundo dilacerado. Responder à violência com a violência leva, na melhor das hipóteses, a migrações forçadas e a atrozes sofrimentos, porque grandes quantidades de recursos são destinadas a fins militares e subtraídas às exigências do dia-a-dia dos jovens, das famílias em dificuldade, dos idosos, dos doentes, da grande maioria dos habitantes da terra. No pior dos casos, pode levar à morte física e espiritual de muitos, se não mesmo de todos”.
“O próprio Jesus viveu em tempos de violência. Ensinou que o verdadeiro campo de batalha, onde se defrontam a violência e a paz, é o coração humano: ‘Porque é do interior do coração dos homens que saem os maus pensamentos’ (Mc 7, 21). Mas, perante esta realidade, a resposta que oferece a mensagem de Cristo é radicalmente positiva: Ele pregou incansavelmente o amor incondicional de Deus, que acolhe e perdoa, e ensinou os seus discípulos a amar os inimigos (cf. Mt 5, 44) e a oferecer a outra face (cf. Mt 5, 39). Quando impediu, aqueles que acusavam a adúltera, de a lapidar (cf. Jo 8, 1-11) e na noite antes de morrer, quando disse a Pedro para repor a espada na bainha (cf. Mt 26, 52), Jesus traçou o caminho da não-violência que Ele percorreu até ao fim, até à cruz, tendo assim estabelecido a paz e destruído a hostilidade (cf. Ef 2, 14-16). Por isso, quem acolhe a Boa Nova de Jesus, sabe reconhecer a violência que carrega dentro de si e deixa-se curar pela misericórdia de Deus, tornando-se assim, por sua vez, instrumento de reconciliação, como exortava São Francisco de Assis: A paz que anunciais com os lábios, conservai-a ainda mais abundante nos vossos corações”.

NATAL PERENE!

        “Transcorridos muitos séculos desde que Deus criou o mundo e fez o homem  à sua imagem; - séculos depois de haver cessado o dilúvio, quando o Altíssimo fez resplandecer o arco-íris, sinal de aliança e de paz; - vinte e um séculos depois do nascimento de Abraão, nosso pai; - treze séculos depois da saída de Israel do Egito, sob a guia de Moisés; - cerca de mil anos depois da unção de Davi, como rei de Israel; - na septuagésima quinta semana da profecia de Daniel; - na nonagésima quarta Olimpíada de Atenas; - no ano 752 da fundação de Roma; - no ano 538 do edito de Ciro, autorizando a volta do exílio e a reconstrução de Jerusalém; - no quadragésimo segundo ano do império de César Otaviano Augusto, enquanto reinava a paz sobre a terra, na sexta idade do mundo: JESUS CRISTO DEUS ETERNO E FILHO DO ETERNO PAI, querendo santificar o mundo com a sua vinda, foi concebido por obra do Espírito Santo e se fez homem; transcorridos nove meses, nasceu da Virgem Maria, em Belém de Judá. Eis o Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo a natureza humana. Venham, adoremos o Salvador! Ele é Emanuel, Deus Conosco”. Este é o solene anúncio oficial do Natal, feito pela Igreja na primeira Missa da noite de Natal!
            O Natal é a primeira festa litúrgica, o recomeçar do ano religioso, como a nos ensinar que tudo recomeçou ali. O nascimento de Jesus foi o princípio da revelação do grande mistério da Redenção que começava a se realizar e já tinha começado na concepção virginal de Jesus, o novo Adão. Deus queria que o seu projeto para a humanidade fosse reformulado num novo Adão, já que o primeiro Adão havia falhado por não querer se submeter ao seu Senhor, desejando ser o senhor de si mesmo e juiz do bem e do mal. Assim, Deus enviou ao mundo o seu próprio Filho, o Verbo eterno, por quem e com quem havia criado todas as coisas. Esse Verbo se fez carne, incarnou-se no puríssimo seio da Virgem, por obra do Espírito Santo, e começou a ser um de nós, nosso irmão, Jesus. Veio ensinar ao homem como ser servo de Deus. Por isso, sendo Deus, fez-se em tudo semelhante a nós, para que tivéssemos um modelo bem próximo de nós e ao nosso alcance. Jesus é Deus entre nós, o “Emanuel – Deus conosco”, a face da misericórdia do Pai.
São Francisco de Assis inventou o presépio, a representação iconográfica do nascimento de Jesus, para que refletíssemos nas grandes lições desse maior acontecimento da história da humanidade, seu marco divisor, fonte de inspiração para pintores e místicos.
Que tal se fizéssemos um Natal contínuo, pensando mais no divino Salvador, na sua doutrina, no seu amor, nas virtudes que nos ensinou, unindo-nos mais a ele pela oração e encontro pessoal com ele, imitando o seu exemplo, praticando as obras de misericórdia, convivendo melhor com nossa família...
Desse modo a mensagem do Natal vai continuar durante todo o Ano Novo, que assim será abençoado e feliz. FELIZ NATAL E ABENÇOADO ANO NOVO!

ESPERANDO O NATAL

            Depois de amanhã começaremos a Novena de preparação para o Santo Natal. Nas Vésperas dos dias que antecedem a grande festa natalina, cantam-se as belíssimas antífonas latinas que começam com a exclamação de desejo “Ó!”: Ó Sabedoria, Ó Adonai, Ó Raiz de Jessé, Ó Chave de Davi, Ó Oriente, Ó Rei das Nações, Ó Emanuel, palavras das antigas profecias bíblicas, referentes ao Salvador cujo nascimento celebraremos no Natal.
            O modelo para nós de expectativa do Messias é a sua Mãe, Maria Santíssima. Por causa dessas antífonas da expectação, o povo deu a ela o título de Nossa Senhora do Ó. É uma devoção muito antiga, surgida na Espanha e em Portugal. Aqui no Brasil, em São Paulo, por exemplo, temos a “Freguesia (paróquia) do Ó”, bairro, onde se encontra a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Expectação do Ó, cuja construção começou em 1610.
              A devoção a Nossa Senhora é inata no povo católico. Enquanto os teólogos, durante séculos, discutiam a base teológica da Imaculada Conceição da Virgem Maria – o dogma de fé só foi proclamado por Pio IX no dia 8 de dezembro de 1864 -, o povo católico já a cultuava por toda a parte. Desde os primeiros séculos, os cristãos já honravam essa prerrogativa de Maria. No século VIII, o culto foi autorizado nas igrejas. A partir do século XII, espalhou-se a celebração dessa festa. Clemente XI, em 1708, elevou-a a festa de preceito. A imagem de Nossa Senhora da Conceição da Praia, na Basílica do mesmo nome em Salvador BA, foi trazida por Tomé de Souza e a primeira capela em seu louvor, foi construída a mando do então governador.
Celebramos dia 12 Nossa Senhora de Guadalupe, padroeira da América Latina. Sob diversos nomes, Maria Santíssima é patrona de muitos países do Novo Mundo, e sua devoção está no coração de todos. O Documento de Aparecida exalta “o papel tão nobre e orientador que a religiosidade popular desempenha, especialmente a devoção mariana, que contribuiu para nos tornar mais conscientes de nossa comum condição de filhos de Deus” (37). Mas, reconhece que “no entanto, devemos admitir que essa preciosa tradição começa a diluir-se... Nossas tradições culturais já não se transmitem de uma geração à outra...” (39). “Observamos que o crescimento percentual da Igreja não segue o mesmo ritmo que o crescimento populacional... Verificamos, deste modo, uma mentalidade relativista no ético e no religioso.... Nas últimas décadas vemos com preocupação, que numerosas pessoas perdem o sentido transcendental de suas vidas e abandonam as práticas religiosas...”. “Tal como manifestou o Santo Padre no Discurso Inaugural de nossa Conferência: ‘Percebe-se certo enfraquecimento da vida cristã no conjunto da sociedade e da própria pertença à Igreja Católica’.” (100).
Rezemos mais, pois estamos em “um novo período da história, caracterizado pela desordem generalizada..., pela difusão de uma cultura distante e hostil à tradição cristã e pela emergência de variadas ofertas religiosas que tratam de responder, à sua maneira, muitas vezes errônea, à sede de Deus que nossos povos manifestam” (DocAp 10). 

IMACULADA DESDE A CONCEPÇÃO!

         Amanhã celebraremos a Imaculada Conceição de Nossa Senhora, ou seja, honramos o privilégio singular concedido por Deus à Virgem Maria, escolhida para a Mãe do Filho de Deus encarnado, preservando-a, desde a sua concepção, da herança do pecado original.
Está aí uma luz dada pela Igreja sobre a vida intrauterina. Vida humana, respeitável, com direitos, querida por Deus, objeto do seu amor, desde o primeiro momento da concepção.
“Vossos olhos contemplaram-me ainda em embrião” (Sl 139,16): essa é a citação bíblica escolhida por São João Paulo II para falar sobre o crime abominável do aborto: “o aborto provocado é a morte deliberada e direta... de um ser humano na fase inicial da sua existência, que vai da concepção ao nascimento... Trata-se de um homicídio... A pessoa eliminada é um ser humano que começa a desabrochar para a vida, isto é, o que de mais inocente, em absoluto, se possa imaginar: nunca poderia ser considerado um agressor, menos ainda um injusto agressor! É frágil, inerme, e numa medida tal que o deixa privado inclusive daquela forma mínima de defesa constituída pela força suplicante dos gemidos e do choro do recém-nascido. Está totalmente entregue à proteção e aos cuidados daquela que o traz no seio... (Evangelium Vitae, 58).
“Alguns tentam justificar o aborto, defendendo que o fruto da concepção, pelo menos até certo número de dias, não pode ainda ser considerado uma vida humana pessoal. Na realidade, porém, a partir do momento em que o óvulo é fecundado, inaugura-se uma nova vida que não é a do pai nem a da mãe, mas sim a de um novo ser humano que se desenvolve por conta própria. Nunca mais se tornaria humana, se não o fosse já desde então. A essa evidência de sempre a ciência genética moderna fornece preciosas confirmações. Demonstrou que desde o primeiro instante, se encontra fixado o programa daquilo que será este ser vivo: uma pessoa, esta pessoa individual, com as suas notas características já bem determinadas. Desde a fecundação, tem início a aventura de uma vida humana, cujas grandes capacidades, já presentes cada uma delas, apenas exigem tempo para se organizar e se encontrar prontas para agir... O ser humano deve ser respeitado e tratado como uma pessoa desde a sua concepção e, por isso, desde esse mesmo momento, lhe devem ser reconhecidos os direitos da pessoa, entre os quais e primeiro de todos, o direito inviolável de cada ser humano inocente à vida”  (Evang. Vitae, 60).
E a ciência moderna confirma essa posição da Igreja.  Dr. Jerôme Lejeune, cientista, professor da Universidade René Descartes, de Paris, e especialista em Genética Fundamental, descobridor da causa da síndrome de Down, em entrevista à VEJA, que lhe perguntou se, para ele, a vida começa a existir no momento da concepção, respondeu: “Não quero repetir o óbvio. Mas, na verdade, a vida começa na fecundação. Quando os 23 cromossomos masculinos transportados pelo espermatozoide se encontram com os 23 cromossomos da mulher, todos os dados genéticos que definem o novo ser humano já estão presentes. A fecundação é a marco do início da vida. Daí para frente, qualquer método artificial para destruí-la é um assassinato”.

APROXIMA-SE O NATAL!

         Já estamos no Advento. Palavra oriunda do latim, significando “vinda”, Advento é o “tempo litúrgico da expectativa do Salvador e símbolo da esperança cristã. A salvação que esperamos de Deus tem igualmente o sabor do amor. Na verdade, preparando-nos para o mistério do Natal, assumimos de novo o caminho do povo de Deus para acolher o Filho que nos veio revelar que Deus não é só Justiça, mas é também e antes de tudo Amor (cf. 1 Jo 4, 8). Em todos os lugares, mas, sobretudo onde reinam a violência, o ódio, a injustiça e a perseguição, os cristãos são chamados a dar testemunho deste Deus que é Amor”.
“O Advento é o tempo para preparar os nossos corações a fim de acolher o Salvador, isto é, o único Justo e o único Juiz capaz de dar a cada um a sorte que merece. Aqui, como noutros lugares, muitos homens e mulheres têm sede de respeito, justiça, equidade, sem avistar no horizonte qualquer sinal positivo. Para eles, o Salvador vem trazer o dom da sua justiça (cf. Jr 33, 15). Vem tornar fecundas as nossas histórias pessoais e coletivas, as nossas esperanças frustradas e os nossos votos estéreis. E manda-nos anunciar, sobretudo àqueles que são oprimidos pelos poderosos deste mundo, bem como a quantos vivem vergados sob o peso dos seus pecados: ‘Judá será salvo e Jerusalém viverá em segurança. Este é o nome com o qual será chamada: Senhor-nossa justiça’ (Jr 33, 16). Sim, Deus é Justiça! Por isso mesmo nós, cristãos, somos chamados a ser no mundo os artesãos duma paz fundada na justiça” (Papa Francisco, Catedral de  Bangui, República Centro-Africana, 29/11/2015).
Celebramos duas vindas de Jesus Cristo ao mundo. A primeira, com a sua encarnação, ocorrida historicamente há cerca de dois mil anos, celebraremos no Natal. A segunda, em que meditamos no tempo do Advento, é o retorno glorioso no fim dos tempos. Como disse o Papa Bento XVI, “esses dois momentos, que cronologicamente são distantes – e não se sabe o quanto -, tocam-se profundamente, porque com sua morte e ressurreição Jesus já realizou a transformação do homem e do cosmo que é a meta final da criação. Mas antes do final, é necessário que o Evangelho seja proclamado a todas as nações, disse Jesus no Evangelho de São Marcos (cf. Mc 13,10). A vinda do Senhor continua, o mundo deve ser penetrado pela sua presença. E esta vinda permanente do Senhor no anúncio do Evangelho requer continuamente nossa colaboração; e a Igreja, que é como a Noiva, a esposa prometida do Cordeiro de Deus crucificado e ressuscitado (cf. Ap 21,9), em comunhão com o Senhor colabora nesta vinda do Senhor,  na qual já inicia o seu retorno glorioso”(Angelus, 2/12/2012).    
Há ainda uma terceira vinda de Cristo, também celebrada no Natal. Acontece em nosso coração, pela sua graça. Essa será a grande alegria do Natal: “O encontro pessoal com o amor de Jesus que nos salva... A ALEGRIA DO EVANGELHO enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Todos os que se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento” (Francisco, Evangelii Gaudium). 

A DIGNIDADE DO SER HUMANO

          No dia 20 de novembro último, comemorou-se o dia nacional da consciência negra, cujo fim é o da superação do racismo, especialmente contra os de pele negra ou similar.
        Antropologicamente, a palavra “raça”, referindo-se a seres humanos, está superada, pois biologicamente significa “subespécie” e conota um preconceito contra certos grupos humanos, o que vem a ser “racismo”. Às vezes se usa o termo “raça” para identificar um grupo cultural ou étnico-linguístico, mas seriam preferíveis os termos “população”, “etnia” ou “cultura”.
A Igreja já se pronunciou diversas vezes contra o preconceito baseado na cor da pele ou na etnia, proclamando, firmada na divina Revelação, a dignidade de toda a pessoa criada à imagem de Deus, a unidade do gênero humano no plano do Criador e a reconciliação com Deus de toda a humanidade pela Redenção de Cristo, que destruiu o muro de ódio que separava os mundos contrapostos, para que em Cristo se recapitulassem todos os seres humanos. Com essas premissas, a Igreja prega o respeito recíproco dos grupos étnicos e das chamadas “raças” e a sua convivência fraterna. A mensagem de Cristo foi para todos os povos e nações, sem distinção nem preferências. É o tema repetido por São Paulo: “Não há distinção entre judeu e grego, porque todos têm um mesmo Senhor...” (Rm 10,12); “já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre..., pois todos vós sois um em Cristo Jesus” (Gal 3, 28).
Infelizmente, com a descoberta e colonização do Novo Mundo, no século XVI, começaram a surgir abusos e ideologias racistas. Os Papas não tardaram a reagir. Assim, em 1537, na Bula Sublimis Deus, o Papa Paulo II denunciava os que consideravam os indígenas como seres inferiores e solenemente afirmava: “No desejo de remediar o mal que foi causado, nós decidimos e declaramos que os chamados Indígenas, bem como todas as populações com que no futuro a cristandade entrará em relação, não deverão ser privados da sua liberdade e dos seus bens – não obstante as alegações contrárias – ainda que eles não sejam cristãos, e que, ao contrário, deverão ser deixados em pleno gozo da sua liberdade e dos seus bens”. Mais tarde, o Papa Urbano VIII teve até que excomungar aqueles que detinham escravos indígenas. Essas normas da Igreja nem sempre foram obedecidas, mesmo por muitos dos seus membros. Quando começou o tráfico de Negros, vendidos pelos próprios africanos como escravos e trazidos para as novas terras, os Papas e os teólogos pronunciaram-se contra essa prática abominável. O Papa Leão XIII condenou-a com vigor na sua encíclica In Plurimis, de maio de 1888, ao felicitar o Brasil por ter abolido a escravidão. E o Papa São João Paulo II não hesitou, no seu discurso aos intelectuais africanos, em Yaoundé, em 13 de agosto de 1985, em deplorar que pessoas pertencentes a nações cristãs tenham contribuído para esse tráfico de Negros.
E quando, fruto da ideologia racista do século XVIII e XIX (Nietzsche), surgiu na Alemanha o partido totalitário nacional-socialista, o Papa Pio XI, na encíclica Mit Brennender Sorge, condenou as doutrinas nazistas da superioridade da raça ariana sobre as demais.

A LITURGIA É SAGRADA

           Continuo nesse artigo a citar pérolas do último livro do Cardeal Robert Sarah, prefeito da Congregação para o Culto Divino, com o título “A Força do Silêncio - contra a ditadura do barulho”, pois se trata do Cardeal encarregado pelo Papa de velar pela Liturgia na Igreja.           
            “Não pretendo ocupar nosso tempo opondo uma liturgia à outra, ou o rito de São Pio V ao do Beato Paulo VI. Mas trata-se de entrar no grande silêncio da liturgia; é preciso saber deixar-se enriquecer por todas as formas litúrgicas latinas ou orientais que privilegiam o silêncio. Sem este espírito contemplativo, a liturgia se tornará uma ocasião de dilacerações odiosas e de enfrentamentos ideológicos em vez de ser o lugar da nossa unidade e da nossa comunhão no Senhor. Este é o momento de entrar neste silêncio litúrgico, voltados para o Senhor, que o Concílio quis restaurar”.
          “O que vou dizer agora não entra em contradição com minha submissão e minha obediência à autoridade suprema da Igreja. Desejo profunda e humildemente servir a Deus, a Igreja e ao Santo Padre, com devoção, sinceridade e apego filial. Mas eis aqui a minha esperança: se Deus quiser, quando ele quiser e como ele quiser, na liturgia, a reforma da reforma será feita. Apesar do ranger de dentes, ela virá, pois nela está em jogo o futuro da Igreja”.
            “Estragar a liturgia é destruir nossa relação com Deus e a expressão concreta de nossa fé cristã. A Palavra de Deus e o ensinamento doutrinal da Igreja são ainda ouvidos, mas as almas que desejam voltar-se para Deus, oferecer-lhe o verdadeiro sacrifício de louvor e adorá-lo, já não são cativadas por liturgias demasiadamente horizontais, antropocêntricas e festivas, assemelhadas muitas vezes a acontecimentos culturais barulhentos e vulgares. Os meios de comunicação invadiram totalmente e transformaram em espetáculo o Santo Sacrifício da Missa, memorial da morte de Jesus na cruz para a salvação das nossas almas. O sentido do mistério desaparece pelas mudanças, pelas adaptações permanentes, decididas de forma autônoma e individual para seduzir nossas mentalidades modernas profanadoras, marcadas pelo pecado, pelo secularismo, pelo relativismo e pela rejeição de Deus”.
            “Em muitos países do Ocidente, vemos os pobres abandonar a Igreja católica, pois ela foi tomada de assalto por pessoas mal intencionadas que se fazem passar por intelectuais e que desprezam os pequenos e os pobres. Eis o que o Santo Padre deve denunciar em alto e bom som, pois uma Igreja sem os pobres não é mais a Igreja, mas um simples ‘clube’. Atualmente, no Ocidente, quantos templos vazios, fechados, destruídos ou transformados em estruturas profanas, violando sua sacralidade e seu destino original! Apesar disso, conheço numerosos sacerdotes e fiéis que vivem sua fé com um zelo extraordinário e lutam diariamente para preservar e enriquecer as casas de Deus. Devemos urgentemente redescobrir a beleza, a sacralidade e a origem divina da liturgia...”. 

A FORÇA DO SILÊNCIO

             Sob este título acima, saiu o novo livro do Cardeal Robert Sarah, prefeito da Congregação para o Culto Divino, com o subtítulo “Contra a ditadura do barulho”. Limito-me a citar algumas pérolas colhidas em tão preciosa obra.
            “Estarem todos em silêncio prolongado diante do Senhor presente em seu Sacramento é uma das experiências mais autênticas da nossa Igreja... Comunhão e contemplação não podem estar separadas, vão juntas. Para estar em comunhão verdadeira com outra pessoa, eu devo conhece-la, saber ficar perto dela em silêncio, escutá-la, olha-la com amor” (cf Bento XVI).
            “Hoje em dia, certos padres tratam a Eucaristia com um grande desprezo. Eles veem a Missa como um banquete em que se fala, onde os cristãos fiéis ao ensinamento de Jesus, os divorciados recasados, os homens e mulheres em situações de adultério, os turistas não batizados que participam das celebrações eucarísticas das grandes multidões anônimas podem ter acesso ao Corpo e Sangue de Cristo, sem distinção... Há um grande perigo de transformar a Eucaristia, ‘o grande mistério da Fé’, em uma quermesse vulgar e de profanar o Corpo e o Sangue precioso de Cristo. Os sacerdotes que distribuem as espécies sagradas não conhecendo ninguém e dão o Corpo de Jesus a todos, sem discernimento entre os cristãos e os não cristãos, participam da profanação do Santo Sacrifício eucarístico. Aqueles que exercem a autoridade na Igreja se tornam culpados, por uma forma de cumplicidade voluntária, ao deixar que se cometa o sacrilégio e a profanação do Corpo de Cristo nestas gigantescas e ridículas autocelebrações, onde tão poucos percebem que ‘vós anunciais a morte do Senhor, até que ele venha’”.
            “Padres infiéis à ‘memória’ de Jesus insistem mais sobre o aspecto festivo e a dimensão fraterna da missa do que no sacrifício sangrento de Cristo na Cruz. A importância das disposições interiores e a necessidade de nos reconciliarmos com Deus aceitando de nos deixar purificar pelo sacramento da confissão não estão em moda hoje em dia...”.
           “No começo de nossas celebrações eucarísticas, como é possível eliminar Cristo que carrega sua cruz e caminha dolorosamente sob o peso dos nossos pecados para o lugar do sacrifício? Há muitos sacerdotes que entram triunfalmente e sobem ao altar, saudando à direita e à esquerda para parecerem simpáticos. Observem o triste espetáculo de algumas celebrações eucarísticas... Por que tanta imprudência e mundanismo no momento do Santo Sacrifício? Por que tanta profanação e superficialidade...? “No começo de nossas celebrações eucarísticas, como é possível eliminar Cristo que carrega sua cruz e caminha dolorosamente sob o peso dos nossos pecados para o lugar do sacrifício? Há muitos sacerdotes que entram triunfalmente e sobem ao altar, saudando à direita e à esquerda para parecerem simpáticos. Observem o triste espetáculo de algumas celebrações eucarísticas... Por que tanta imprudência e mundanismo no momento do Santo Sacrifício? Por que tanta profanação e superficialidade...? 
         Em um sacrifício tão único e essencial, há necessidade dessas fantasias e dessas criatividades subjetivas?... Muitos cristãos fervorosos tocados pela Paixão e a Morte de Cristo sobre a Cruz não têm a força de chorar ou de lançar um grito doloroso em direção aos padres e bispos que se apresentam como animadores de espetáculos e se erigem como protagonistas principais da Eucaristia. Esses fiéis nos dizem, entretanto: ‘nós não queremos nos reunir com homens em torno de um homem! Nós queremos ver Jesus! Mostrai-o a nós durante o silêncio e a humildade da vossa oração!”.

RESSUSCITAREMOS COM CRISTO

          O dia de hoje é dedicado à memória dos fieis defuntos, dos nossos falecidos, daqueles que estiveram conosco e hoje estão na eternidade, os “finados”, aqueles que chegaram ao fim da vida terrena e já começaram a vida eterna. Uma nova vida começou eternamente.
          Em sua última instrução – “Ad resurgendum cum Christo” –, a propósito da sepultura dos defuntos e da conservação das cinzas da cremação, a Congregação para a Doutrina da Fé dá as razões doutrinais e pastorais da preferência cristã em dar sepultura aos corpos.
“A Ressurreição de Jesus é a verdade culminante da fé cristã, anunciada como parte fundamental do Mistério Pascal desde as origens do cristianismo... Pela sua morte e ressurreição, Cristo libertou-nos do pecado e deu-nos uma vida nova... Por outro lado, Cristo ressuscitado é princípio e fonte da nossa ressurreição futura: ‘Cristo ressuscitou dos mortos como primícias dos que morreram...; do mesmo modo que em Adão todos morreram, assim também em Cristo todos serão restituídos à vida’ (1 Cor 15. 20-22)”.
“Se é verdade que Cristo nos ressuscitará ‘no último dia’, é também verdade que, de certa forma já ressuscitamos com Cristo. De fato, pelo Batismo, estamos imersos na morte e ressurreição de Cristo e sacramentalmente assimilados a Ele... Unidos a Cristo pelo Batismo, participamos já, realmente, na vida de Cristo ressuscitado”.
“Graças a Cristo, a morte cristã tem um significado positivo. A Liturgia da Igreja reza: ‘Para os que creem em Vós, Senhor, a vida não acaba, apenas se transforma; e, desfeita a morada deste exílio terrestre, adquirimos no céu uma habitação eterna’. Na morte, o espírito separa-se do corpo, mas na ressurreição Deus torna a dar vida incorruptível ao nosso corpo transformado, reunindo-o, de novo, ao nosso espírito. Também nos nossos dias a Igreja é chamada a anunciar a fé na ressurreição: ‘A ressurreição dos mortos é a fé dos cristãos: acreditando nisso somos o que professamos’”.
“Seguindo a antiga tradição cristã, a Igreja recomenda insistentemente que os corpos dos defuntos sejam sepultados no cemitério ou num lugar sagrado. Ao lembrar a morte, sepultura e ressurreição do Senhor, mistério à luz do qual se manifesta o sentido cristão da morte, a inumação é, antes de mais, a forma mais idônea para exprimir a fé e a esperança na ressurreição corporal”.   
“Embora não proíba a cremação, “a Igreja continua a preferir a sepultura dos mortos, uma vez que assim se evidencia uma estima maior pelos defuntos. Enterrando os corpos dos fiéis defuntos, a Igreja confirma a fé na ressurreição da carne, e deseja colocar em relevo a grande dignidade do corpo humano... A Igreja, que como mãe acompanhou o cristão durante a sua peregrinação terrena, oferece ao Pai, em Cristo, o filho da sua graça e entrega a terra os restos mortais na esperança de que ressuscitará para a glória”.
Rezemos por aqueles que nos precederam com o sinal da fé e dormem no sono da paz.

MALEDICÊNCIA

           Nesse tempo de internet, em que se pode anonimamente falar mal à vontade de todo o mundo, em que se compartilham notícias sem preocupação com a verdade delas, em que se pode postar boatos que denigrem o bom nome das pessoas, em que se pode dizer meias verdades que impressionam e destroem a fama alheia, vale a pena recordar o que dizem os santos a respeito desse vício, que leva o nome de maledicência. O exagero, a caricatura, a meia-verdade, a reticência, a suspeita lançada ao ar, são tipos de maledicência que se assemelham à mentira, e até piores do que ela, por serem mais sedutoras.  
O Catecismo da Igreja Católica ensina: “Toda pessoa goza de um direito natural à honra do próprio nome, à sua reputação e ao seu respeito. Dessa forma, a maledicência e a calúnia ferem as virtudes da justiça e da caridade” (C.I.C. 2479).
          “Não procures fazer figura pondo-te a criticar os outros e aprende a tornar mais perfeita a tua vida antes que denegrir a dos outros. São verdadeiramente poucos os que sabem afastar-se deste defeito, e é bem raro encontrar alguém que queira mostrar-se tão irrepreensível, na sua vida, que não critique com satisfação a vida alheia. Não há outra coisa, de fato, que ponha a alma em tanto barulho e que torne o espírito tão volúvel e leviano quanto o prestar fé com facilidade a tudo, e dar ouvido temerariamente às palavras dos críticos. E daí que surgem discórdias sobre discórdias e sentimentos de ódio que não têm motivo de ser. É justamente este defeito que frequentemente torna inimigas pessoas que, antes, eram amigas do peito. Se este mal está universalmente difuso, se este vício está vivo e forte em muitos, é justamente porque encontra, quase em todos, ouvidos complacentes” (São Jerônimo, Carta IV, 148, 16).
“Quem tira injustamente a boa fama ao seu próximo, além do pecado que comete, está obrigado à restituição inteira e proporcionada à natureza, qualidade e circunstância da maledicência, porque ninguém pode entrar no céu com os bens alheios, e entre os bens exteriores a fama e a honra são os mais preciosos e os mais caros... A maledicência, afinal, proferida a modo de gracejo, é a mais cruel de todas... Nunca digas: fulano é um bêbado ou ladrão, mesmo que o vejas uma vez embriagar-se ou roubar; seria uma inverdade, porque uma só ação não dá nome às coisas... Noé e Ló embriagaram-se uma vez e nem por isso foi bêbado nenhum dos dois. Nem tão pouco foi São Pedro um blasfemador e sanguinário, porque blasfemou um dia e feriu um homem uma vez. O nome de vicioso ou virtuoso supõe um hábito contraído por muitos atos repetidos do vício ou duma virtude... Todas as coisas aparecem amarelas aos olhos dos achacados de icterícia... A malícia do juízo temerário, dum modo semelhante a esta doença, faz aparecer tudo mau aos olhos dos que a apanharam... Eis aí como devemos julgar do próximo: o melhor possível; e, se uma ação tivesse cem aspectos diferentes, deveríamos encara-la unicamente pelo lado mais belo” (São Francisco de Sales, Filoteia).
“Se alguém não peca pela língua, esse é perfeito” (Tg 3, 2). 

MISSÕES E MISERICÓRIDIA

          No próximo domingo, a Igreja celebra o dia mundial das Missões. Em sua mensagem para esse dia das Missões, com o tema “Igreja missionária, testemunha de misericórdia”, o Papa Francisco ensina que “o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, que a Igreja está vivendo, proporciona uma luz particular também ao Dia Mundial das Missões de 2016: convida-nos a olhar a missão ad gentes como uma grande, imensa obra de misericórdia quer espiritual quer material. Com efeito, neste Dia Mundial das Missões, todos somos convidados a ‘sair’, como discípulos missionários, pondo cada um a render os seus talentos, a sua criatividade, a sua sabedoria e experiência para levar a mensagem da ternura e compaixão de Deus à família humana inteira. Em virtude do mandato missionário, a Igreja tem a peito quantos não conhecem o Evangelho, pois deseja que todos sejam salvos e cheguem a experimentar o amor do Senhor. Ela ‘tem a missão de anunciar a misericórdia de Deus, coração pulsante do Evangelho’ (Bula Misericordiae Vultus, 12), e anunciá-la em todos os cantos da terra, até alcançar toda a mulher, homem, idoso, jovem e criança”.
            É claro que essa atividade missionária requer empenho e sacrifício, para secundarmos assim a ação de Deus, já que ele quis usar de nós: “Em muitos lugares, a evangelização parte da atividade educativa, à qual o trabalho missionário dedica esforço e tempo, como o vinhateiro misericordioso do Evangelho (cf. Lc 13, 7-9; Jo 15, 1), com paciência para esperar os frutos depois de anos de lenta formação; geram-se assim pessoas capazes de evangelizar e fazer chegar o Evangelho onde ninguém esperaria vê-lo realizado. A Igreja pode ser definida ‘mãe’, mesmo para aqueles que poderão um dia chegar à fé em Cristo. Espero, pois, que o povo santo de Deus exerça o serviço materno da misericórdia, que tanto ajuda os povos que ainda não conhecem o Senhor a encontrá-Lo e a amá-Lo. Com efeito, a fé é dom de Deus, e não fruto de proselitismo; mas cresce graças à fé e à caridade dos evangelizadores, que são testemunhas de Cristo. Quando os discípulos de Jesus percorrem as estradas do mundo, é-lhes pedido aquele amor sem medida que tende a aplicar a todos a mesma medida do Senhor...”.
        A missão que Jesus confiou à sua Igreja é universal, para todos os povos: “Cada povo e cultura tem direito de receber a mensagem de salvação, que é dom de Deus para todos... Os missionários sabem, por experiência, que o Evangelho do perdão e da misericórdia pode levar alegria e reconciliação, justiça e paz. O mandato do Evangelho – ‘Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado’ (Mt 28, 19-20) – não terminou, antes pelo contrário impele-nos a todos, nos cenários presentes e desafios atuais, a sentir-nos chamados para uma renovada ‘saída’ missionária: cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho”.


A SENHORA "APARECIDA"

            Hoje celebramos a Padroeira do Brasil. Em suas caravelas, ornadas com a Cruz da Ordem de Cristo, os portugueses trouxeram-nos a devoção à Mãe de Jesus: Pedro Álvares Cabral, em sua nau capitânia, transportava a imagem de Nossa Senhora da Esperança.
Mas a devoção a Nossa Senhora Aparecida começou em 1717, quando, por ocasião da visita do Conde de Assumar à cidade de Guaratinguetá, SP, foi pedido aos pescadores locais peixes para o banquete do nobre visitante. Três pescadores, amigos entre si, João Alves, Domingos Garcia e Filipe Pedroso, tentavam e não conseguiam os peixes que necessitavam, quando apanharam em suas redes uma pequena imagem truncada de Nossa Senhora da Conceição e a seguir, num lance de rede sucessivo, a cabeça da mesma imagem, conseguindo, num terceiro lance, imensa quantidade de peixes. A esse milagre sucederam muitos outros. A imagem foi chamada de “Aparecida” e colocada numa pequena capela que, com o tempo, tornou-se o monumental Santuário Nacional, maior centro de peregrinação do país.
É óbvio que ali houve algo sobrenatural. Pois, como explicar que uma simples imagem, quebrada, sem uma intervenção divina e uma bênção especial da Mãe de Jesus, pudesse atrair milhões de pessoas em oração fervorosa, ininterruptamente, há quase três séculos?
Em 1904, Nossa Senhora Aparecida, foi coroada Rainha do Brasil. No Congresso Mariano de 1929, quando se comemorou o Jubileu de Prata dessa Coroação, os bispos do Brasil decidiram enviar um pedido ao Papa para que declarasse Nossa Senhora Aparecida Padroeira de toda a nação brasileira. Este pedido tornou-se realidade através do Decreto do Papa Pio XI, de 16 de julho de 1930, no qual diz: “... Na plenitude de nosso Poder Apostólico, pelo teor da presente Carta, constituímos e declaramos a Beatíssima Virgem Maria concebida sem mancha, conhecida sob o título de Aparecida, Padroeira principal de todo o Brasil junto de Deus... concedendo isso para promover o bem espiritual dos fiéis no Brasil e para aumentar, cada vez mais, sua devoção à Imaculada Mãe de Deus...”.
A proclamação oficial se realizou numa grande manifestação popular de um milhão de pessoas, no Rio de Janeiro, então capital federal, com o reconhecimento oficial do Governo do país, pela presença do seu Presidente, Dr. Getúlio Dornelles Vargas, e de outras autoridades civis, militares e eclesiásticas. Era o Brasil reconhecendo oficialmente sua padroeira.
Que o Brasil, que nasceu católico desde a sua descoberta, cujo primeiro monumento foi um altar e uma cruz, que teve como primeira cerimônia uma Missa, que tem essa Senhora Padroeira, mostre-se digno de tais origens e de tal Patrona, em suas instituições, suas leis, seus governantes, sua política, seus legisladores, sua população e seu modo de viver, na verdadeira justiça e caridade, na ordem e no verdadeiro progresso, na harmonia e no bem comum, na lei de Deus e na coerência com os princípios da fé cristã, base da nossa identidade pátria e princípio de toda a convivência honesta, solidária e pacífica.


BEM-AVENTURADOS OS POBRES


         No Brasil, celebra-se hoje a festa de São Benedito, o Preto. Nascido na Sicília, Itália, por volta do ano 1526, filho de negros que haviam sido escravos ou que descendiam de outros que o tinham sido, ingressou num convento franciscano de Palermo, capital da Sicília. Foi um religioso exemplar, primando pelo espírito de oração, pela humildade e pela obediência. Embora simples irmão leigo e analfabeto, a sabedoria e o discernimento que possuía fizeram com que fosse nomeado mestre de noviços e mais tarde fosse eleito superior do convento. Atendia a consultas de muitas pessoas que o procuravam para pedir conselhos e orientação segura. Foi favorecido por Deus com o dom dos milagres. Tendo concluído seu período como superior, retornou com humildade e naturalidade para a cozinha do convento, reassumindo com alegria as funções modestas que antes desempenhara. E assim, na mais sublime indiferença pela sua própria pessoa, faleceu com fama de santidade, para receber de Deus a recompensa prometida aos humildes e pobres de coração.
        Que São Benedito nos ensine a humildade e a pobreza do coração, isto é, o desapego do egoísmo e das riquezas deste mundo, quer as tenhamos ou não. E que ele nos ajude a vencer o racismo, a discriminação das pessoas pela cor da sua pele ou da sua etnia, reconhecendo sempre em todas as pessoas nossos irmãos, dignos de nosso apreço e respeito.
        Numa época em que o apego desordenado às riquezas se espalhava e contaminava a espiritualidade cristã na Idade Média, Deus suscitou Francisco de Assis, que festejamos ontem.  Ele é o santo da pobreza e simplicidade evangélicas e, como o desapego de si mesmo e de todas as coisas, chegou a ser imagem viva do Crucificado.

        Este grande santo, admirado por todos, até pelos não cristãos, não nasceu santo, pois até aos 25 anos viveu como os outros jovens, amigo de festas e esbanjador. Mas Deus mudou o seu coração. Seguindo a radicalidade do Evangelho, própria dos santos, Francisco renunciou à rica herança paterna e decidiu viver sem nada.
        Quando rezava um dia, ouviu de Jesus Crucificado essa mensagem: “Francisco, vai e repara a minha igreja”. Ele pensava tratar-se da igreja de São Damião, em Assis. Mas a sua vocação era mais universal. Deserdado pelo pai, rico comerciante, e expulso de casa, começou a cuidar dos leprosos, frequentava suas cabanas e levava-lhes esmolas, beijando sempre essas mãos repelentes. Fundou a Ordem dos Frades Menores, uma das maiores da Igreja, e, com Santa Clara de Assis, o ramo feminino da mesma Ordem, as irmãs Clarissas.
        Esses santos, São Benedito e São Francisco de Assis, vêm nos ensinar o espírito de pobreza e a humildade, virtudes básicas do cristianismo. Não são virtudes fáceis, pois contrariam o nosso egoísmo e nosso apego aos bens materiais. Não são para os fracos, mas para os heróis, como deve ser todo cristão, a exemplo de Jesus Cristo: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e siga-me” (Mt 16, 24).

O DIREITO DE NASCER



       Por determinação da 43ª Assembleia Geral dos Bispos do Brasil, em 2005, celebra-se, em todo o Brasil, de 1 a 7 de outubro, a Semana Nacional da Vida e no dia 8 de outubro o Dia do Nascituro, ou seja, o Dia pelo direito de nascer. “A Semana Nacional da Vida e o Dia do Nascituro são ocasiões para que toda a Igreja continue afirmando sua posição favorável à vida desde o seio materno até o seu fim natural, bem como a dignidade da mulher e a proteção das crianças” (Dom Leonardo Ulrich Steiner, secretário geral da CNBB). Uma data esquecida, mas que vale a pena recordar. Nascituro, o que está para nascer, é o que todos fomos um dia, no útero de nossa mãe, onde teve início nossa existência, graças a Deus.
        Foi escolhido o dia 8 de outubro, por ser próximo ao dia em que se celebra a Padroeira do Brasil (12 de outubro), cujo título, ao evocar a concepção, lembra o fruto correspondente: Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Mãe de Deus que se fez homem, Jesus Cristo, nascituro em seu seio, que faz João Batista exultar de alegria no ventre de Isabel (Lc 1,39-45).
        A propósito, diante da atual banalização da vida e de opiniões favoráveis ao aborto, defendido por inúmeras pessoas influentes, é importante lembrar que a Igreja compreende as situações difíceis que levam mães a abortar, mas, por uma questão de princípios, defende com firmeza a vida do nascituro, como bem nos ensina S. João Paulo II na Carta Encíclica "Evangelium Vitae" (Sobre Valor e a Inviolabilidade da Vida Humana): “É verdade que, muitas vezes, a opção de abortar reveste para a mãe um caráter dramático e doloroso: a decisão de se desfazer do fruto concebido não é tomada por razões puramente egoístas ou de comodidade, mas porque se quereriam salvaguardar alguns bens importantes como a própria saúde ou um nível de vida digno para os outros membros da família. Às vezes, temem-se para o nascituro condições de existência tais que levam a pensar que seria melhor para ele não nascer. Mas essas e outras razões semelhantes, por mais graves e dramáticas que sejam, nunca podem justificar a supressão deliberada de um ser humano inocente” (n. 58). E, usando da prerrogativa da infalibilidade, o Papa define: “Com a autoridade que Cristo conferiu a Pedro e aos seus sucessores, em comunhão com os Bispos – que de várias e repetidas formas condenaram o aborto e que... apesar de dispersos pelo mundo, afirmaram unânime consenso sobre esta doutrina - declaro que o aborto direto, isto é, querido como fim ou como meio, constitui sempre uma desordem moral grave, enquanto morte deliberada de um ser humano inocente. Tal doutrina está fundada sobre a lei natural e sobre a Palavra de Deus escrita, é transmitida pela tradição da Igreja e ensinada pelo Magistério ordinário e universal” (n. 62).
        Agradeçamos ao Criador pelo dom da vida que nos deu, e renovemos o nosso compromisso de lutar pela vida daqueles que, como nós fomos também, ainda não têm voz, mas que são chamados a um dia agradecerem a Deus por tão grande dom. Lutemos pela vida, contra o aborto.

A RELIGIÃO DA PALAVRA

            No próximo domingo, dia 27, celebraremos o dia nacional da Bíblia, dedicado a despertar e promover entre os fiéis o conhecimento e o amor dos Livros Sagrados, a Palavra de Deus escrita, redigida sob a moção do Divino Espírito Santo, motivando-os para sua leitura cotidiana, atenta e piedosa e, ao mesmo tempo, premunindo-os contra os erros correntes com relação à Bíblia mal interpretada.
          “Na Igreja, veneramos extremamente as Sagradas Escrituras, apesar da fé cristã não ser uma ‘religião do Livro’: o cristianismo é a ‘religião da Palavra de Deus’, não de ‘uma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo’” (Verbum Domini – Bento XVI -, 7)
É de São Jerônimo, o grande tradutor dos Livros Santos, a célebre frase: “Ignorar a Sagrada Escritura é ignorar o próprio Cristo”. Portanto, o conhecimento e o amor às Escrituras decorrem do conhecimento e do amor que todos devemos a Nosso Senhor. 
         O ponto central da Bíblia, convergência de todas as profecias, é Jesus Cristo. O Antigo Testamento é preparação para a sua vinda e o Novo, a realização do seu Reino. “O Novo estava latente no Antigo e o Antigo se esclarece no Novo” (Santo Agostinho).
        Dizemos que a Bíblia é um livro divino e humano: inspirada por Deus, mas escrita por homens, por Deus movidos e assistidos enquanto escreviam.
             A Bíblia não é um livro só, mas um conjunto de 73 livros, redigidos por autores diferentes em épocas, línguas, estilos e locais diversos, num espaço de tempo de cerca de mil e quinhentos anos. Sua unidade se deve ao fato de terem sido todos eles inspirados por Deus, seu autor principal e garantia da sua inerrância.
          Mas a Bíblia não é um livro de ciências humanas. Por isso a Igreja Católica reprova a leitura fundamentalista da Bíblia, que teve sua origem na época da Reforma Protestante e que pretende dar a ela uma interpretação literal em todos os seus detalhes, o que não é correto.
           Além disso, a Bíblia não é um livro fácil de ser lido e interpretado. São Pedro, falando das Epístolas de São Paulo, nos diz que “nelas há algumas passagens difíceis de entender, cujo sentido os espíritos ignorantes ou pouco fortalecidos deturpam, para a sua própria ruína, como o fazem também com as demais Escrituras” (II Pd 3, 16). 
            Por isso, o mesmo São Pedro nos adverte: “Sabei que nenhuma profecia da Escritura é de interpretação pessoal. Porque jamais uma profecia foi proferida por efeito de uma vontade humana. Homens inspirados pelo Espírito Santo falaram da parte de Deus” (2Pd 1, 20-21). Assim, o ofício de interpretar autenticamente a Palavra de Deus escrita (a Bíblia Sagrada) ou transmitida oralmente (a Sagrada Tradição) foi confiado unicamente ao Magistério vivo da Igreja, cuja autoridade se exerce em nome de Jesus Cristo, que disse aos Apóstolos e seus sucessores “até a consumação dos séculos”: “Ide e ensinai a todos os povos tudo o que vos ensinei... quem vos ouve a mim ouve”. 

VOTO DECISIVO

        Estamos próximos das eleições municipais, que decidirão o futuro do nosso município. Não pense que o seu voto não é importante, que é apenas um a mais, que não resolverá nada, que tanto faz votar nesse ou naquele candidato! O seu voto é decisivo. Você é responsável pelo nosso futuro. Vote conscientemente, como bom cidadão.
Por isso, nós, Bispos do Estado do Rio de Janeiro, usando como epígrafe a frase do profeta Isaías (32, 17): “A paz é fruto da justiça”, emitimos uma nota sobre as Eleições Municipais de 2016, que diz assim: 
“Seu voto para escolher o Prefeito e Vereadores é importante e decisivo para o futuro.
Depende de você que o seu município seja governado por pessoas que desejem o bem de todos. Não troque seu voto por favorecimentos pessoais, benefícios materiais, promessas ilusórias, etc. Escolha candidatos que:
- tenham ficha limpa: não sejam corruptos nem multipliquem seus bens pela corrupção;
- sejam bons administradores, porque quem não cuida bem de seu patrimônio não tem condições de representar o povo na Prefeitura nem na Câmara Municipal;
- respeitem e promovam a família;
            - valorizem a educação das crianças, adolescentes e jovens, o ensino religioso nas escolas, a liberdade religiosa, o lazer sadio e o atendimento melhor à saúde;
            - defendam sempre a vida e sejam contra o aborto e as drogas;
            - promovam o cuidado da casa comum, respeitando o equilíbrio da natureza: florestas, rios, saneamento básico e a construção de moradia em lugares sem risco;
            - apresentem projetos concretos para a digna mobilidade humana;
            - comprometam-se com estratégias eficazes para segurança e paz da sociedade e estimulem um desenvolvimento que gere oportunidades de trabalho.
            O futuro do seu município está em suas mãos!”
            Reflita sobre cada uma dessas qualidades, para que possa fazer uma boa escolha. Analise os candidatos, seu passado, seus projetos, suas características, etc.
            Não seja corrupto: não venda o seu voto. Não corrompa o candidato perguntando o que ele vai lhe dar em troca do seu voto. Pense mais no bem da cidade e da população do que no seu bem próprio. Você se beneficiará de um bom governo e de uma boa legislatura.
            Você também é responsável pela sua cidade e município. Pela sua limpeza, seu trânsito, suas construções, sua saúde, sua educação, seu respeito pelos concidadãos. Faça a sua parte e estará contribuindo para o bem de todos. Seja honesto e cumpridor dos seus deveres. Não se espelhe em maus exemplos de desonestidade, mesmo que sejam de pessoas ditas importantes. Faça o bem a todos, sem distinção, com amor e honestidade. Faça a sua parte e não espere pelos outros. Assim o mundo, a começar de nosso município, será melhor.

PÁTRIA AMADA

           Neste dia da Pátria, vale lembrar a virtude do patriotismo, dever e amor para com o nosso país, incluído no quarto Mandamento da Lei de Deus. Jesus, nosso divino modelo, amava tanto sua pátria, que chorou sobre sua capital, Jerusalém, ao prever os castigos que sobre ela viriam, consequência da sua infidelidade aos dons de Deus. É tempo oportuno para refletirmos sobre a nação, na qual vivemos e da qual esperamos o nosso bem comum. Será que também não devemos chorar sobre nossa pátria amada, ao vermos, na política, tanta corrupção, falta de honestidade, ética, honradez, com total desprezo das virtudes humanas e cristãs, dos pequenos e dos grandes?  Será que tinha razão Antônio Ermírio de Moraes, quando disse: “A política é a arte de pedir votos aos pobres, dinheiro aos ricos e depois mentir a ambos”?
  “Estamos perdidos há muito tempo... O país perdeu a inteligência e a consciência moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada. Os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direção a conveniência. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita... Ninguém crê na honestidade dos homens públicos... A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia. O povo está na miséria. Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente. O Estado é considerado na sua ação fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências. Diz-se por toda a parte, o país está perdido! Algum opositor do atual governo? Não!”(Eça de Queirós, 1871).  
Segundo Aristóteles, “o homem é por natureza um animal político, destinado a viver em sociedade” (Política, I, 1,9). Política vem do grego pólis, que significa cidade. E, continua Aristóteles, “toda a cidade é evidentemente uma associação, e toda a associação só se forma para algum bem, dado que os homens, sejam eles quais forem, tudo fazem para o fim do que lhes parece ser bom”. E Santo Tomás de Aquino cunhou o termo bem comum, ou bem público, que é o bem de toda a sociedade, dando-o como finalidade do Estado. “A comunidade política existe... em vista do bem comum; nele encontra a sua completa justificação e significado e dele deriva o seu direito natural e próprio. O bem comum compreende o conjunto das condições de vida social que permitem aos indivíduos, famílias e associações alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (Gaudium et Spes, 74). Daí se conclui que a cidade – o Estado - exige um governo que a dirija para o bem comum. Não se pode separar a política da direção para o bem comum. Procurar o bem próprio na política é um contrassenso.
Como cristãos, nós sabemos que a base da moral e da ética é a lei de Deus, natural e positiva, traduzida na conduta pelo que se chama o santo temor de Deus ou a consciência reta e timorata. Uma vez perdido o santo temor de Deus, perde-se a retidão da consciência, que passa a ser regida pelas paixões. Uma vez abandonados os valores morais e os limites éticos, a política fica ao sabor das paixões desordenadas do egoísmo, da ambição e da cobiça.

NÃO AO SABOR DO VENTO

          “Que fostes ver no deserto? Uma cana agitada pelo vento?... Em verdade, eu vos digo, entre todos os nascidos de mulher não surgiu quem fosse maior que João Batista” (Mt 11, 7.11).
Já comemoramos o nascimento de São João Batista no dia 24 de junho. E no último dia 29, celebramos o seu martírio, sua degolação.
Qual foi a causa da sua morte? São João Batista pregava o arrependimento do pecado e a mudança de vida: “Convertei-vos...” (Mt 3,1). Era o homem da verdade, sem acepção de pessoas. O Rei Herodes havia tomado para si a mulher do seu irmão, Herodíades. João o admoestava contra o seu pecado de infidelidade conjugal e incesto, o que atraiu a ira da amante do rei, que o instigou a meter João no cárcere. “Pois João vivia dizendo a Herodes: ‘Não te é permitido viver com ela’” (Mt 14, 4). No dia do aniversário de Herodes, a filha de Herodíades, Salomé, dançou na frente dos convivas, o que levou o rei, meio embriagado, a prometer-lhe como prêmio qualquer coisa que pedisse. A filha perguntou à mãe, que não perdeu a oportunidade de vingar-se daquele que invectivava seu pecado. Fez a filha pedir ao rei a cabeça de João Batista. João foi decapitado na prisão, merecendo o elogio de Jesus, por ser um homem firme e não uma cana agitada ao sabor do vento.
Estamos no Ano da Misericórdia, proclamado pelo Papa Francisco.  É tempo de perdão. Muita gente pode interpretar mal esse tempo, achando que pode continuar no pecado e receber o perdão. Mas a absolvição supõe o arrependimento e o propósito de deixar o pecado, sem o que o perdão não acontece. O discernimento pastoral prático de uma situação particular, no qual devemos usar toda a misericórdia e compreensão, não anula a regra geral dada por Nosso Senhor: “Quem despede sua mulher e se casa com outra, comete adultério... E se a mulher despede seu marido e se casa com outro, comete adultério também” (Mc 10, 11-12).
“Deus em Jesus é um Deus que tem um sumo respeito pela liberdade da pessoa. ‘Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa’ (Ap 2, 20ª). Não arromba a porta, para entrar de qualquer maneira. A ‘abertura da porta’, de que fala a Escritura, é a conversão ou arrependimento. Conversão, arrependimento e misericórdia que perdoa são como o côncavo e o convexo da mesma figura: uma não se dá sem a outra (Cardeal Carlo Carafa, Arcebispo de Bolonha).
O Cardeal Jorge Medina, prefeito emérito da Congregação para o Culto Divino, no seu livreto “Arrependimento, Porta da Misericórdia”, com apresentação do Cardeal Carafa, acima citado, explica: “O Concílio de Trento define o arrependimento como ‘dor da alma e reprovação do pecado cometido, acompanhados pelo propósito de não pecar mais no futuro’. Este ato de contrição foi sempre necessário para pedir a remissão dos pecados...” E ele continua: “Vivemos em uma sociedade na qual pouco a pouco se está perdendo a sensibilidade em relação ao pecado...”. Esclarece, enfim, que “arrepender-se significa recorrer a Deus, Pai de misericórdia”. 

MÃE QUE CHORAVA

         Dois santos admiráveis celebramos nessa semana: Santa Mônica (dia 27) e Santo Agostinho (dia 28), do século IV.
Aurélio Agostinho nasceu em Tagaste, na Região de Cartago, na África, filho de Patrício, pagão, e Mônica, cristã fervorosa. Segundo narra ele próprio, Agostinho bebeu o amor de Jesus com o leite de sua mãe. Infelizmente, porém, como acontece muitas vezes, a influência do pai fez com que se retardasse o seu batismo, que ele acabou não recebendo na infância nem na juventude. Estudou literatura, filosofia, gramática e retórica, das quais foi professor. Afastou-se dos ensinamentos da mãe e, por causa de más companhias, entregou-se aos vícios. Cometeu maldades, viveu no pecado durante sua juventude, teve uma amante e um filho, e, pior, caiu na heresia gnóstica dos maniqueus, para os quais trabalhou na tradução de livros.
Sua mãe, Santa Mônica, rezava e chorava por ele todos os dias. “Fica tranquila”, disse-lhe certa vez um bispo, “é impossível que pereça um filho de tantas lágrimas!” E foi sua oração e suas lágrimas que conseguiram a volta para Deus desse filho querido transviado.
Agostinho dizia-se um apaixonado pela verdade, que, de tanto buscar, acabou reencontrando na Igreja Católica: “ó beleza, sempre antiga e sempre nova, quão tarde eu te amei!”; “fizestes-nos para Vós, Senhor, e o nosso coração está inquieto, enquanto não descansa em Vós!”: são frases comoventes escritas por ele nas suas célebres “Confissões”, onde relata a sua vida de pecador arrependido. Transferiu-se com sua mãe para Milão, na Itália. Dotado de inteligência admirável, a retórica, da qual era professor, o fez se aproximar de Santo Ambrósio, Bispo de Milão, também mestre nessa disciplina. Levado pela mãe a ouvir os célebres sermões do santo bispo e nutrido com a leitura da Sagrada Escritura e da vida dos santos, Agostinho converteu-se realmente, recebeu o Batismo aos 33 anos e dedicou-se a uma vida de estudos e oração. Ordenado sacerdote e bispo, além de pastor dedicado e zeloso, foi intelectual brilhantíssimo, dos maiores gênios já produzidos em dois mil anos da História da Igreja. Escreveu numerosas obras de filosofia, teologia e espiritualidade, que ainda exercem enorme influência. Foi, por isso, proclamado Doutor da Igreja. De Santo Agostinho, disse o Papa Leão XIII: “É um gênio vigoroso que, dominando todas as ciências humanas e divinas, combateu todos os erros de seu tempo”. Sua vida demonstra o poder da graça de Deus que vence o pecado e sempre, como Pai, espera a volta do filho pródigo. 
Sua mãe, Santa Mônica, é o exemplo da mulher forte, de oração poderosa, que rezou a vida toda pela conversão do seu filho, o que conseguiu de maneira admirável. Exemplo para todas as mães que, mesmo tendo ensinado o bom caminho aos seus filhos, os vêm desviados nas sendas do mal. A oração e as lágrimas de uma mãe são eficazes diante de Deus. E a vida de Santo Agostinho é uma lição para nunca desesperarmos da conversão de ninguém, por mais pecador que seja, e para sempre estarmos sinceramente à procura da verdade e do bem.  

BELÉM, A CASA DO PÃO

           Estamos em Belém do Pará, onde acontece, de 15 a 21 deste mês de agosto, o XVII Congresso Eucarístico Nacional, cujo tema é “Eucaristia e partilha na Amazônia missionária”, com o lema “Eles o reconheceram no partir do Pão” (Cf. Lc 24, 35), tirado da passagem do encontro dos discípulos de Emaús com Jesus ressuscitado. É todo o Brasil de joelhos adorando o Senhor na Eucaristia e ouvindo o seu apelo missionário na Amazônia: “Ide fazer discípulos entre todas as nações” (Mt 28, 19).
            O Congresso Eucarístico, que congrega milhares de pessoas em torno do altar, testemunhando sua fé cristã, tem como finalidade aumentar o nosso fervor e devoção à Santíssima Eucaristia, porque “a Eucaristia é o coração e o ápice da vida da Igreja, pois nela Cristo associa sua Igreja e todos os seus membros a seu sacrifício de louvor e ação de graças oferecido uma vez por todas na cruz a seu Pai; por seu sacrifício ele derrama as graças da salvação sobre o seu corpo, que é a Igreja. A Eucaristia é o memorial da Páscoa de Cristo: isto é, da obra da salvação realizada pela Vida, Morte e Ressurreição de Cristo, obra esta tornada presente pela ação litúrgica. Enquanto sacrifício, a Eucaristia é também oferecida em reparação dos pecados dos vivos e dos defuntos, e para obter de Deus benefícios espirituais ou temporais” (Cat.Igr. Cat. nn.1407, 1409 e 1414).
            Consta que o primeiro Congresso Eucarístico foi celebrado em 1881 em Lille (França), por iniciativa de um grupo de fiéis leigos, apoiados por S. Pedro Julião Eymard. Foi uma celebração solene, de que participaram fiéis e bispos de vários países da Europa. De lá para cá, outros países quiseram repetir a bela iniciativa. No Brasil, até agora, já houve 16 Congressos Eucarísticos Nacionais. O Papa São João Paulo II esteve presente em dois: em Fortaleza - CE (1980) e em Natal - RN (1991). Nos outros ele foi representado por um Enviado Especial.
            Segundo São João Paulo II, o Congresso Eucarístico é “um grande evento eclesial que deve envolver cada Igreja particular, cada paróquia, cada comunidade religiosa e cada movimento eclesial. Todos devem sentir-se chamados a tomar parte no Congresso mediante uma catequese mais intensa sobre a Eucaristia e uma participação mais consciente e ativa na Liturgia Eucarística e um sentido de adoração capaz de interiorizar a celebração do Mistério Pascal, com uma oração que transforma a vida toda numa oferta pela vida do mundo, segundo o exemplo de Cristo”.
            Conforme nos explica Dom Alberto Taveira, arcebispo de Belém, “o XVII Congresso Eucarístico Nacional se realizará no Quarto Centenário do início da Evangelização da Amazônia e da fundação da Cidade de Santa Maria de Belém do Grão Pará... é convocação a todo o Brasil, reunido e peregrino, para viver e testemunhar a vocação que é nossa e de toda a Igreja... para que se realize mais uma vez, aqui em Belém, Portal da Amazônia, o que acontece na Igreja desse seus albores: “Eles o reconheceram no partir do Pão”, o lema que escolhemos”. 

AS OLIMPÍADAS

         Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro são uma ocasião para nossa reflexão sobre os valores cristãos de disciplina, fraternidade, paz e reconciliação do mundo, através dos esportes.
          São Paulo Apóstolo escrevendo aos Coríntios, familiarizados com os jogos olímpicos, partilhou a admiração desses povos helenos pelas proezas dos atletas nos estádios, tirando do seu exemplo lições para a nossa vida espiritual (cf. 1 Cor 9, 24-25).
A religião não é alheia ao esporte e a Igreja sempre apoiou o desporto sadio. A finalidade do verdadeiro esporte é tornar o corpo são e dócil para que paralelamente a alma possa se robustecer e enobrecer. Na alta Idade Média, a verdadeira e não a falsa que muitas vezes historiadores superficiais tentam nos impingir, houve uma florescência ideal do verdadeiro desporto cristão. O Barão Pedro de Coubertin, renovador dos Jogos Olímpicos da atualidade, cuja iniciativa foi encorajada pelo Papa São Pio X, assim escreve: “A Idade Média conheceu um espírito desportivo de intensidade e vigor provavelmente superiores aos que conheceu a própria antiguidade grega”. Ele atribui isso à influência primordial da religião que criou uma atmosfera das mais favoráveis à eclosão e desenvolvimento do espírito cavalheiresco que consiste na “lealdade praticada sem hesitação” (Pierre de Coubertin, La Pédagogie Sportive). O cristianismo tem, pois, grande influência no jogo limpo, no “fair-play”.
“As Olimpíadas são o maior acontecimento esportivo mundial, nas quais participam atletas de muitas nações, revestindo-se assim de um alto valor simbólico. É por isso que a Igreja católica as olha com uma simpatia e atenção particulares”. Ele convidou os católicos a rezar para que “segundo a vontade de Deus, os Jogos de Londres sejam uma verdadeira experiência de fraternidade entre os povos da Terra”. “Eu dirijo minhas saudações aos organizadores, aos atletas e aos expectadores, e eu rezo para que, no espírito da trégua olímpica, a boa vontade gerada por este acontecimento esportivo internacional traga frutos, promovendo a paz e a reconciliação no mundo” (Bento XVI, no Ângelus de 22/7/2012, falando sobre os Jogos Olímpicos de Londres).
         “As potencialidades do fenômeno desportivo tornam-no instrumento significativo para o desenvolvimento global da pessoa e fator muito útil para a construção de uma sociedade mais humana. O sentido de fraternidade, a magnanimidade, a honestidade e o respeito pelo corpo — sem dúvida virtudes indispensáveis para todos os bons atletas — contribuem para a edificação de uma sociedade civil na qual o ‘agonismo’ substitua o antagonismo, o encontro prevaleça sobre a competição e o confronto leal sobre a contraposição vingativa. Entendido desta maneira, o desporto não é um fim, mas um meio; pode tornar-se veículo de civilização e distração genuína, estimulando a pessoa a pôr em campo o melhor de si e a evitar o que pode ser perigoso ou de grave prejuízo para si mesmo e para os outros” (Bento XVI, por ocasião do campeonato europeu de futebol, citando São João Paulo II). 

O CURA D'ARS

           O mês de agosto é o mês dos sacerdotes e das vocações, porque nele se celebra o patrono de todos os padres, São João Maria Vianney, o Cura ou Pároco da cidadezinha francesa de Ars, “modelo sem par, para todos os países, do desempenho do ministério e da santidade do ministro”, no dizer de São João Paulo II, paradigma para a nova evangelização. 
Nascido de uma família de camponeses católicos e muito caridosos, João Maria tinha sete anos quando o Terror da Revolução Francesa reinava em Paris e os padres eram exilados ou mortos. Recebeu a primeira comunhão aos treze anos, durante o segundo Terror, quando a igreja de sua cidade foi fechada e as tropas revolucionárias atravessavam a paróquia. O governo revolucionário estabeleceu a constituição civil do clero e só os padres que faziam esse juramento cismático eram conservados nos cargos. Os outros padres, fiéis à Igreja e que não aceitavam aquele cisma, eram perseguidos, mas atendiam secretamente os fiéis nos paióis das fazendas. Foi a visão desses heróis da fé que fez surgir no jovem Vianney a sua vocação sacerdotal. Candidato, pois, ao heroísmo e à cruz no ministério.
Enfrentou dificuldades no Seminário, donde chegou a ser despedido por incapacidade nos estudos, teve problemas com o serviço militar, conseguiu, porém, aos vinte e nove anos, ser ordenado sacerdote, mas sem permissão para ouvir confissões. Após três anos, foi enviado a uma pequeníssima paróquia, Ars, onde permaneceu durante 42 anos, até o fim da sua vida.
“Há pouco amor de Deus nessa paróquia”, disse-lhe o Vigário Geral ao nomeá-lo, “Vossa Reverendíssima procurará colocá-lo lá”. De fato, Ars, nesse período pós Revolução Francesa, estava esquecida de Deus: pouca frequência às Missas, trabalho contínuo nos domingos, bailes, blasfêmias, etc. O Pe. Vianney começou com penitências e orações próprias. Pregação e catequese contínuas, visitas às famílias e caridade para com os pobres. A Igreja foi se enchendo. Ouvia confissões desde a madrugada até a noite. Peregrinos de toda a França acorriam a Ars, chegando a cem mil por ano. Suas pregações eram assistidas por bispos e cardeais. Seu catecismo era ouvido por grandes pregadores que ali vinham aprender com tanta sabedoria. Morreu aos 74 anos, esgotado pelas penitências e trabalhos apostólicos no ministério sacerdotal. Dizia esse herói da Fé: “É belo morrer depois de ter vivido na cruz”.
Por que razão a Igreja escolheu este santo tão simples para patrono dos padres? Porque sua vida demonstra a nulidade humana e a grandeza do poder de Deus. Para que aprendamos que não são nossos dotes e qualidades humanas que salvam as almas: Deus é que é o protagonista de toda ação pastoral. Por isso também o escolhemos para patrono de nossa União Sacerdotal, transformada pela Santa Sé em Administração Apostólica.
           Que todos os fiéis, os grandes interessados, rezem pelos nossos sacerdotes e seminaristas, para que eles imitem a humildade, pobreza, retidão, zelo e fidelidade desse grande herói do ministério sacerdotal, que tanto honrou o sacerdócio paroquial e a Igreja de Cristo.